quarta-feira, 25 de julho de 2018

O esqueleto da baleia e a janela do avião








      Há uns vinte anos visitei um museu que fica localizado dentro de uma antiga fortaleza no litoral de Santa Catarina. Entre canhões,  manequins fardados como soldados da época do Império e  outras peças históricas, havia, numa sala enorme e escura, um esqueleto incompleto de baleia, não recordo de qual espécie, exposto. Eu nunca vira uma baleia de verdade antes, ao vivo. Ou o que restara dela. Recordo até hoje da sensação que tive, algo único, olhando para o tamanho daquela ossada. Jamais imaginara algo assim. Era como se o animal estivesse me dizendo: veja como você é pequena. Veja minha magnitude. Sim, diante de mim, você é insignificante.

   Eu senti um enorme respeito diante daquela baleia, e nunca mais esqueci isso. Anos mais tarde, na minha primeira viagem de avião, na qual eu estava totalmente aterrorizada, pois tinha certeza que ele cairia, ousei olhar pela janela, quando nos aproximávamos do litoral de São Paulo, e aos poucos iam se delineando os contornos da cidade lá embaixo, igual no Google Maps, aproximando, quarteirões, prédios, casas, as avenidas... Algo enorme, parecendo infinito, e imaginei quantas pessoas estavam abaixo de mim, cada uma delas envolvida em sua própria vida, presa no trânsito, dentro de um escritório, as crianças nas escolas, os doentes nos hospitais, centenas, milhares, milhões de vidas fervilhando, correndo, trabalhando, morrendo, nascendo, como se fosse um formigueiro humano.
    E então o mesmo sentimento que tive contemplando a ossada da baleia me invadiu, fazendo-me concluir que sim, somos pequenos, somos apenas formigas, ou melhor, somos iguais a elas, em sua insignificância, somos grãos de areia, partículas de pó. Somos pouco. E essa constatação não é em nada desesperadora, pelo contrário, ela nos liberta do fardo de acreditarmos que somos únicos e especiais. Porque não somos. Somos apenas uma partícula de insignificância buscando motivos e explicações dentro de um mundo complexo, vasto e inexplicável.

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