Logo cedo o jornal conta a história de dois rapazes que se
beijavam num metrô em São Paulo e acabaram espancados por quinze homens.
Mais tarde, na
escola, algumas alunas batem boca. Indago qual o motivo. Uma delas responde:
“Fulana me chamou de sapatona”. Pergunto o que é sapatona e a outra diz:
“machorra”. Continuo o questionamento até que a turma conclui: “é lésbica,
professora”. Crianças de apenas dez anos que empregam um vocabulário
depreciativo e preconceituoso com relação à opção sexual das pessoas.
Não é o único
preconceito que surge na escola. Na minha, há duas meninas lindas, irmãs e
negras, que convivem com apelidos e xingamentos constantes, devido a cor da sua
pele. Essa é uma atitude que podemos perceber até de figuras importantes e
influentes, como no caso de Silvio Santos, que fez um comentário depreciativo
sobre o cabelo de uma atriz negra em seu programa.
Excluindo-se o
fato ocorrido no metrô, ato covarde e bárbaro, geralmente justificado com
comentários do tipo: “eles pediram, por que estavam se beijando daquela
forma?”, os demais exemplos são “caquinhos de preconceito” que presenciamos
diariamente.
Dias antes,
folheando uma revista local, vi as fotos de uma mulher alta, magra, cabelos
muito lisos e sedosos, olhos lindos, mas aí algo parecia fora do contexto: um
bigode. Era um rapaz, ou melhor, um travesti. Fiquei chocada, não pelo fato de
alguém ser tão corajoso a ponto de “sair do armário” de forma tão escancarada,
numa cidade do interior. Minha perplexidade veio quando percebi meu próprio
preconceito.
Em maior ou
menor grau, todos temos preconceitos, pois somos humanos. Seria bom se pudéssemos
juntar “os caquinhos de preconceito” para formar um grande espelho, no qual
fôssemos capazes de visualizar nossas falhas, medos, inseguranças. Talvez esses
sejam os fatores que levam alguns de nós à barbárie, a cometer atos insanos,
violentos. Temos medo de ver, de enxergar as diferenças, porque talvez essas
diferenças atinjam nossas convicções do certo e do errado, do bom e do mau (aquilo
que costumamos denominar sistema de crenças).
Paradoxo: ao
mesmo tempo em que o ser humano é capaz de pousar um robô em um cometa, parece
incapaz de conviver com semelhantes que ousam ser diferentes.