A indústria cultural, anteriormente
denominada “cultura de massa”, é aquela que atinge a maioria da população,
através de veículos como a televisão e o rádio. Utilizando esses meios de
comunicação, as novelas, músicas e artistas, jogadores de futebol,
apresentadores de programas de auditório, moldam costumes, estimulam o consumismo,
o culto à beleza e à juventude, enfim,
legitimam os valores da sociedade moderna. Na mídia testemunhamos a
ascensão e o ostracismo súbitos das celebridades, dos sucessos musicais de
gosto duvidoso alardeados repetitivamente, constatamos o culto ao efêmero e o
elogio à futilidade. Pergunte a uma aluna de sete anos o que ela gostaria de
ser no futuro. Possivelmente a resposta obtida será: “modelo, atriz, cantora”.
E os meninos? Jogador de futebol, uma quase unanimidade. Letras de músicas como
a que reproduzo a seguir “grudam” na memória dos alunos:
“Eu não tô de
brincadeira, eu meto tudo, eu pego firme pra valer
Chego cheio de
maldade
Eu quero ver
você gemer
Eu te ligo e
chega a noite, vou com tudo e vai que vai
Tem sabor de
chocolate o sexo que a gente faz”
(Naldo – Amor de
chocolate)
Não se trata de repudiar ou
condenar o gosto musical ou preferências dos alunos. Pelo contrário, o
professor precisa adotar uma postura de respeito, sem condenar. No entanto, a
escola não pode ficar isenta do seu papel, afinal de contas, está expresso em
sua filosofia que “o objetivo é formar cidadãos críticos e conscientes capazes
de atuar na sociedade”. Penso que quando uma criança repete um refrão do tipo
“Eu quero tchu, eu quero tchá”, não está de forma alguma pensando sobre as
palavras que pronuncia. Da mesma forma, constatar que nossos alunos estão cada
vez mais consumistas, que o supérfluo toma o espaço do necessário, que as
relações passam a ser descartáveis, e não ajudá-los numa tomada de consciência
a respeito, é um crime. Partindo da leitura das letras de músicas que
estão “bombando”, passando pela reflexão e discussão, chegando a conclusões que
jamais as crianças e jovens chegariam (sem a mediação da escola e do professor),
percorrendo esse caminho, só assim temos a possibilidade de vislumbrar um
futuro diferente para o nosso país.
Por exemplo, no ano de 2013, a funkeira Anitta fez um enorme
sucesso na mídia, tendo a música a seguir incluída na trilha sonora de novela
da Rede Globo:
“ Prepara, que
agora é a hora
Do show das
poderosas
Que descem e
rebolam
Afrontam as
fogosas
Só as que
incomodam
Expulsam as
invejosas
Que ficam de
cara quando toca
Prepara”
Ao ouvir esse tipo de música sendo
cantada por alunas de oito, nove anos, questiono: que mensagem fica no
inconsciente das meninas? Que mulher é essa, poderosa, vencedora porque “tem
corpo”? Nessa visão, só aquelas consideradas bonitas, desejáveis, gostosas, têm
chance de sucesso. Obviamente não podemos proibir que cantem, mas temos a
possibilidade de indagar: “o que você entende dessa música, onde ela é cantada,
quem é a pessoa que compôs, porque faz sucesso...” Talvez, aos poucos, os alunos
consigam um certo distanciamento, uma forma diferente de ver e realmente
enxergar o que está por trás dessa cultura tão massificada, que precisa ser
questionada. Portanto, a leitura e análise de músicas “do momento”, com o
objetivo de questionar estereótipos, preconceitos, valores tão inculcados no
imaginário das pessoas, é extremamente necessária, diria até indispensável.
Por fim, há tantos exemplos de
músicas brasileiras de qualidade, com letras inteligentes, que podem ser
utilizadas nas aulas. Um exemplo é o extinto e conhecido grupo Legião Urbana, famoso
pela crítica social em suas composições, feitas, algumas, há mais de vinte
anos. Um trecho da música “Perfeição” lembra o que ainda acontece, diariamente,
em nosso país:
Vamos celebrar
A estupidez humana
A estupidez de todas as nações
O meu país e sua corja
De assassinos
Covardes, estupradores
E ladrões
A estupidez humana
A estupidez de todas as nações
O meu país e sua corja
De assassinos
Covardes, estupradores
E ladrões
Vamos celebrar
A estupidez do povo
Nossa polícia e televisão
Vamos celebrar nosso governo
E nosso Estado que não é nação
A estupidez do povo
Nossa polícia e televisão
Vamos celebrar nosso governo
E nosso Estado que não é nação
Celebrar a juventude sem escolas
As crianças mortas
Celebrar nossa desunião
As crianças mortas
Celebrar nossa desunião
Um contraste enorme entre esse exemplo
e as “criações” do funk e de alguns compositores
atuais. Essa comparação precisa ser feita em nossas aulas; a escola necessita
tornar-se um espaço de reflexão e conscientização constante.
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