quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

A indústria cultural: uma possibilidade de formar alunos críticos e conscientes




         A indústria cultural, anteriormente denominada “cultura de massa”, é aquela que atinge a maioria da população, através de veículos como a televisão e o rádio. Utilizando esses meios de comunicação, as novelas, músicas e artistas, jogadores de futebol, apresentadores de programas de auditório, moldam costumes, estimulam o consumismo, o culto à beleza e à juventude, enfim,  legitimam os valores da sociedade moderna. Na mídia testemunhamos a ascensão e o ostracismo súbitos das celebridades, dos sucessos musicais de gosto duvidoso alardeados repetitivamente, constatamos o culto ao efêmero e o elogio à futilidade. Pergunte a uma aluna de sete anos o que ela gostaria de ser no futuro. Possivelmente a resposta obtida será: “modelo, atriz, cantora”. E os meninos? Jogador de futebol, uma quase unanimidade. Letras de músicas como a que reproduzo a seguir “grudam” na memória dos alunos:

“Eu não tô de brincadeira, eu meto tudo, eu pego firme pra valer
Chego cheio de maldade
Eu quero ver você gemer
Eu te ligo e chega a noite, vou com tudo e vai que vai
Tem sabor de chocolate o sexo que a gente faz”
(Naldo – Amor de chocolate)

                 Não se trata de repudiar ou condenar o gosto musical ou preferências dos alunos. Pelo contrário, o professor precisa adotar uma postura de respeito, sem condenar. No entanto, a escola não pode ficar isenta do seu papel, afinal de contas, está expresso em sua filosofia que “o objetivo é formar cidadãos críticos e conscientes capazes de atuar na sociedade”. Penso que quando uma criança repete um refrão do tipo “Eu quero tchu, eu quero tchá”, não está de forma alguma pensando sobre as palavras que pronuncia. Da mesma forma, constatar que nossos alunos estão cada vez mais consumistas, que o supérfluo toma o espaço do necessário, que as relações passam a ser descartáveis, e não ajudá-los numa tomada de consciência a respeito, é um crime. Partindo da leitura das letras de músicas que estão “bombando”, passando pela reflexão e discussão, chegando a conclusões que jamais as crianças e jovens chegariam (sem a mediação da escola e do professor), percorrendo esse caminho, só assim temos a possibilidade de vislumbrar um futuro diferente para o nosso país.
           Por exemplo, no ano de 2013, a funkeira Anitta fez um enorme sucesso na mídia, tendo a música a seguir incluída na trilha sonora de novela da Rede Globo:

“ Prepara, que agora é a hora
Do show das poderosas
Que descem e rebolam
Afrontam as fogosas
Só as que incomodam
Expulsam as invejosas
Que ficam de cara quando toca
Prepara”

           Ao ouvir esse tipo de música sendo cantada por alunas de oito, nove anos, questiono: que mensagem fica no inconsciente das meninas? Que mulher é essa, poderosa, vencedora porque “tem corpo”? Nessa visão, só aquelas consideradas bonitas, desejáveis, gostosas, têm chance de sucesso. Obviamente não podemos proibir que cantem, mas temos a possibilidade de indagar: “o que você entende dessa música, onde ela é cantada, quem é a pessoa que compôs, porque faz sucesso...” Talvez, aos poucos, os alunos consigam um certo distanciamento, uma forma diferente de ver e realmente enxergar o que está por trás dessa cultura tão massificada, que precisa ser questionada. Portanto, a leitura e análise de músicas “do momento”, com o objetivo de questionar estereótipos, preconceitos, valores tão inculcados no imaginário das pessoas, é extremamente necessária, diria até indispensável.
             Por fim, há tantos exemplos de músicas brasileiras de qualidade, com letras inteligentes, que podem ser utilizadas nas aulas. Um exemplo é o extinto e conhecido grupo Legião Urbana, famoso pela crítica social em suas composições, feitas, algumas, há mais de vinte anos. Um trecho da música “Perfeição” lembra o que ainda acontece, diariamente, em nosso país:
Vamos celebrar
A estupidez humana
A estupidez de todas as nações
O meu país e sua corja
De assassinos
Covardes, estupradores
E ladrões
Vamos celebrar
A estupidez do povo
Nossa polícia e televisão
Vamos celebrar nosso governo
E nosso Estado que não é nação
Celebrar a juventude sem escolas
As crianças mortas
Celebrar nossa desunião
         Um contraste enorme entre esse exemplo e as “criações” do funk  e de alguns compositores atuais. Essa comparação precisa ser feita em nossas aulas; a escola necessita tornar-se um espaço de reflexão e conscientização constante.

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