Nelson Mandela faleceu em 2013. Mandela dispensa explicações
e comentários. Curiosamente, alguns dias após o falecimento do líder
sul-africano, assisti ao filme “Repórteres da Guerra”. O filme conta a história real de um grupo de fotógrafos da África
do Sul, que ficou conhecido mundialmente como “Clube do Bang-Bang”. A principal motivação para assisti-lo foi a
ânsia de saber mais sobre a vida de Kevin Carter, um dos componentes do
referido grupo que fez a famosa foto de uma criança africana faminta (foto
vencedora do Prêmio Pulitzer), quase morta, tendo às suas costas um abutre
prestes a entrar em ação. Kevin foi massacrado publicamente por não ter ajudado
a criança que morria de fome e cometeu suicídio pouco tempo depois. De fato,
fiquei conhecendo mais sobre ele e também a respeito do companheiro Greg
Marinovich, agraciado também pelo mesmo Prêmio, mas por ter registrado com sua
câmera um fato terrível: o assassinato de um suposto membro do Partido da
Liberdade Inkatha pelos apoiadores do Congresso Nacional Africano (o homem foi
queimado e depois decapitado). Até assistir ao filme, eu sabia muito pouco
sobre a história da África do Sul. E foi por causa do que assisti que
pesquisei, li e aprendi muito sobre o assunto, em pouco tempo. Senti uma certa
vergonha da minha própria ignorância em relação ao Mandela, um dos maiores
líderes mundiais conhecidos, agraciado com um Nobel, exemplo para todos nós.
Mas, para minha surpresa, a aprendizagem e descobertas sobre
a história da África do Sul seriam ampliadas através de outro filme, tocante,
espetacular, emocionante: Borboletas Negras. O filme conta a história da
poetisa Ingrid Jonker, uma escritora sul-africana que viveu no período do Apartheid – regime de segregação racial
vigente de 1948 a
1994. Ela viveu uma relação conflituosa com seu pai, que era membro do Partido
Nacional do Parlamento, extremamente rígido e odiosamente racista. Ingrid era o
contrário do pai e esse confronto ideológico acirrava ainda mais o
relacionamento dos dois. Ela suicidou-se em 1965, dando fim a uma vida intensa
e angustiada. Em 1994, quase trinta anos após sua morte, Nelson Mandela leu o
poema de Ingrid, “A Criança que foi
Assassinada pelos Soldados de Nyanga”, no seu primeiro discurso como presidente
da África do Sul. Depois de assistir ao filme, fui imediatamente pesquisar sobre
a autora. Descobri que a Wikipédia não dispunha da sua biografia em português.
O livro de poemas dela também não está disponível em nossa língua. Consegui ao
menos a tradução integral do poema lido por Mandela em 1994. Assim como chorei
várias vezes durante o filme, não consigo conter as lágrimas os ler as
seguintes palavras:
A criança não está morta
A criança levanta seu punhos contra sua mãe
Que grita África!
Grita o fôlego/De liberdade e das planícies
Nos lugares do sitiado coração
A criança levanta seus punhos contra seu pai
Na marcha das gerações
Que grita África!
Grita o fôlego/Da justiça e do sangue
Nas ruas do batalhado orgulho
A criança não está morta, nem em Langa, nem em Nyanga
Nem em Orlando, nem em Sharpeville
Nem nas delegacias em Philippi
Onde jaz com uma bala em seu cérebro
A criança é a negra sombra dos soldados
em guarda com rifles sarracenos e bastões
A criança está presente em todas assembleias e tribunais
A criança vaga através das janelas das casas e por entre os corações das
mães
A criança que apenas queria brincar ao sol de Nyanga está em todo lugar
A criança que cresceu para ser homem vaga por toda África
A criança, tornada em um gigante, viaja por todo o mundo
Sem um passe
Esqueci de
mencionar: a brilhante poetisa escreveu esse poema após testemunhar o
assassinato de uma criança negra pela polícia africana (branca)
Bem, só tenho
a agradecer ao cinema (refiro-me a pequena parcela de bons filmes, de conteúdo relevante, geralmente feitos com pouco dinheiro, diferentemente das asneiras típicas de Hollywood, que custam milhões de dólares) por ser uma fonte de conhecimento, de descoberta da
história real e palpável, não aquela história fria e impessoal dos livros
didáticos.
Além disso,
ao ler e estudar sobre os mais variados temas, convenço-me de que o que sei é
apenas uma pequena partícula de conhecimento perdida no vasto mar da história
(e da vida).
Sempre aprendendo um pouco mais contigo. Obrigada Ale! :)
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