Luizinho e Ronaldinho são
dois meninos de nove anos de idade que moram numa pequena cidade do interior do
Rio Grande do Sul.
Luizinho é filho de um
advogado e de uma dentista. Cresceu num ambiente letrado, em meio a livros,
revistas, jornais e gibis. Em sua casa há dois computadores, notebook e tablets
com acesso à internet, além de TV à cabo. Desde muito cedo teve brinquedos e jogos
adequados às diferentes fases de seu desenvolvimento.
Ronaldinho é filho de uma dona
de casa. Seu pai trabalha eventualmente fazendo "bicos" como servente
de obras na construção civil. Na casa deles não há livros ou revistas; jornais,
apenas os velhos, para queimar no fogão à lenha. Nada de computador e internet.
Luizinho iniciou sua
escolarização numa escola de educação infantil aos três anos de idade. Ao
ingressar no primeiro ano do Ensino Fundamental estava praticamente alfabetizado.
Ronaldinho não frequentou a
educação infantil. Somente ao ingressar no primeiro ano conheceu as letras, os números, os livros. Ele não
aprendeu a ler nem a escrever no decorrer daquele ano. Nem do ano seguinte. E
nem no outro.
Luizinho estuda numa escola
particular. Compra o lanche diariamente na padaria. Suas escolhas preferidas
são água de coco, suco, coxinha, pastel e sanduíche.
Ronaldinho come a merenda
oferecida pela escola pública na qual estuda. Quando servem algo que ele não
gosta, passa a tarde sem lanchar.
Na lista de material escolar de
Luizinho constavam mais de sessenta itens, dentre eles, livros de literatura
infantil e dicionário. Ele também ganhou uma mochila nova que custou duzentos e
cinquenta reais.
Na lista de materiais de
Ronaldinho foram solicitados dez itens básicos, como lápis de escrever e
cadernos. Mas ele iniciou as aulas sem nada. A mãe utilizou o dinheiro do
bolsa-família para fazer as compras no
mercado. A escola e os professores doaram ao menino o material necessário, que
ele guardou na mochila herdada do irmão mais velho.
Na escola de Luizinho os alunos
são constantemente avaliados, inclusive através de provas, a partir do segundo
ano. Há reprovação para aqueles que não atingem os objetivos de cada ano. A
tarefa de casa é diária e utilizada pelos professores como forma de criar
hábitos de estudo e de reforçar o que é trabalhado em sala de aula.
Na escola de Ronaldinho não há
reprovação até o quarto ano. Não há provas nem avaliações. Os professores
dificilmente dão tarefa de casa. A escola afirma que criança precisa ter tempo de brincar e deve ser poupada de
atividades escolares extras.
Luizinho não teve problemas
para aprender, mas, caso tivesse, receberia apoio da família. Seria levado a
médicos, psicólogos, fonoaudiólogos e pedagogos, caso fosse necessário.
Ronaldinho apresentou
dificuldades para aprender e acompanhar o ritmo das turmas desde o início de sua escolaridade.
Na cidade em que mora há apenas uma psicóloga (paga pelo Estado) para atender a
demanda de todas as escolas do município. A escola que frequenta não oferece
reforço escolar por falta de recursos humanos. Sua família, carente, não tinha
condições de contratar serviços particulares para ajudar a criança.
Luizinho está no quarto ano do
Ensino Fundamental e continua estudando em escola particular. Na primeira
semana de aula de 2014, leu um texto de três páginas e identificou o assunto de
cada parágrafo.
Ronaldinho também está no
quarto ano, numa escola pública. A professora, notando que o menino não
conseguia realizar as atividades em aula, ditou dez palavras para que o menino
as escrevesse. Ele não conseguiu escrever nenhuma palavra. Ronaldinho continua
analfabeto após três anos de escolarização. Indagado sobre o que gostaria de
aprender durante o ano na escola, o menino disse: "Aprender a ler."
Luizinho passa boa parte de
seu tempo livre em frente ao computador e no futuro pretende ser criador de
games.
Ronaldinho enfrenta
dificuldades no laboratório de informática da escola pois não consegue
localizar as letras no teclado do computador. Ele não tem ideia do que deseja
para o futuro.
Luizinho diz que não está
muito empolgado com a Copa do Mundo e que só assistirá aos jogos se não tiver
algo melhor para fazer.
Ronaldinho, apesar de ter sido
batizado com esse nome em homenagem ao jogador, não gosta muito de futebol. Mas
tem esperança que o pai ganhe o carro zero da promoção "Torça, ganhe"
de uma loja da cidade.
Luizinho e Ronaldinho nasceram e
cresceram no país da Copa do Mundo de 2014.
O país do abismo. Abismo social,
cultural e econômico.
Brasil, país da justiça
social?
Brasil, país da igualdade?
Um dia, apesar da Copa, quem
sabe?
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