Na inauguração da primeira loja oficial da
Apple no Brasil teve uma fila enorme que chegava a ocupar até a escada rolante
de um shopping center no Rio de Janeiro. A marca tem uma legião de clientes
fiéis, quase que de uma forma religiosa. Essa excitação em torno de uma loja
reflete uma característica marcante do nosso tempo: a glorificação das coisas.
No caso dos celulares ou iPhones,
por exemplo. Já cansei de presenciar a cena: uma galera jovem reunida, cada
qual com seu "brinquedinho" em mãos, conectado às redes sociais. Há
vinte poucos anos atrás, na minha adolescência, nós nos reuníamos da mesma
forma, mas não havia celular. Aí restava conversar, ouvir música, contar
piadas, paquerar. Tudo ao vivo, não virtualmente. Mas agora uma
"coisa", um objeto, substituiu a convivência. As novas gerações não
vão mais saber o que é olho no olho, nem o que é curtir um show ao vivo, cantar
e dançar feito louco. Basta dar uma olhada no YouTube e comparar os festivais
de rock do passado, nos quais a galera só queria ouvir boa música e se
divertir, e os de agora. No presente, o interesse é fotografar e filmar para
depois postar nas redes sociais.
Mas, voltando às coisas. Vivemos
num mundo excessivamente preocupado com o ter. Seja o carro do ano ou a roupa de marca, seja a casa decorada
seguindo as últimas tendências, o importante é ter coisas. Estamos
transformando nossos próprios corpos nelas: silicone, lipo, botox. Nossa imagem
transforma-se em coisa através das modificações do photoshop.
Bem, eu gosto de comprar roupas e
sapatos. Mas não transformo isso em objetivo de vida, como a história da moça
de 18 anos que trabalhou durante um ano inteiro como balconista, economizando
seu modesto salário para ao final do ano comprar uma bolsa Louis Vuitton que
custava mais de seis mil reais.
Nossa sociedade anseia pelas
coisas. Tem mulher que não passa uma semana sem ir ao cabeleireiro; eu, ao
contrário, detesto. Quando me obrigo a ir, são inevitáveis três horas de
suplício (tintura, corte, progressiva...). Da última vez, a mocinha auxiliar do
salão ofereceu-me uma edição volumosa da revista Vogue para passar o tempo. Ela
fez o seguinte comentário: "Essa revista é boa. Tem tudo".
Fiquei imaginando a que "tudo"
ela se referia. Encontrei maquiagens e perfumes importados, camisetas que
custam meu salário do mês e bolsas
Vuitton e Victor Hugo que custam o equivalente a um carro popular. Poxa, tem
tudo mesmo. Tudo que algumas pessoas desejam e passam uma vida toda tentando
adquirir.
Mas para mim, uma bolsa é apenas
uma bolsa. Qualquer uma serve, independentemente da marca, contanto que cumpra
sua função que é a de carregar objetos.
Dirijo qualquer carro, o que importa
é chegar ao meu destino sem que ele quebre ou gaste muita gasolina.
Coisas são apenas coisas. Elas não
são capazes de nos trazer felicidade ou de preencher o vazio existencial.
Acredito que a única coisa que constitui a exceção chama-se livro. Se as coisas
nos escravizam, as palavras nos libertam.
Taí. Boa
dica para o pessoal da fila da Apple. Passem uma tarde em companhia de um bom
livro. E também para a moça da bolsa Vuitton: há vários tamanhos de livros, que
cabem em diferentes tipos de bolsas (e bolsos).
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